HAMLET
DRAMA EM CINCO ACTOS
WILLIAM SHAKESPEARE
HAMLET
Drama em cinco actos
Traducção Portugueza
Segunda Edição
LISBOA
Imprensa Nacional
1880
INTERLOCUTORES
CLAUDIO--Rei de Dinamarca.
HAMLET--Filho do defunto Rei e sobrinho do Rei reinante.
POLONIO--Camareiro mór.
HORACIO--Amigo de Hamlet.
LAERTE--Filho de Polonio.
VOLTIMANDO }
}
CORNELIO }
}
ROSENCRANTZ } Cortezãos dinamarquezes.
}
GUILDENSTERN }
}
OSRICO }
UM OUTRO CORTEZÃO.
UM PADRE.
REINALDO--Creado de Polonio.
MARCELLO E BERNARDO--Officiaes.
FRANCISCO--Soldado.
UM EMBAIXADOR.
A SOMBRA DO REI HAMLET.
FORTIMBRAZ--Principe de Noruega.
GERTRUDES--Rainha de Dinamarca, mãe de Hamlet.
OPHELIA--Filha de Polonio.
Senhores, damas, officiaes, soldados, actores, padres, coveiros,
marinheiros, mensageiros, creados, etc.
A scena passa-se em Elsenor
ACTO PRIMEIRO
SCENA I
Elsenor, a explanada do castello
FRANCISCO de sentinella, BERNARDO vem encontrar-se com elle
BERNARDO
Quem vem lá? viva quem?
FRANCISCO
Responde tu primeiro, faze alto, deixa-te reconhecer.
BERNARDO
Viva o rei.
FRANCISCO
Bernardo?
BERNARDO
Eu mesmo.
FRANCISCO
És pontual.
BERNARDO
Acaba de dar meia noite; vae descansar, Francisco.
FRANCISCO
Agradeço-te de me teres vindo render; faz um frio glacial, e começava a
sentir-me incommodado.
BERNARDO
Não houve novidade emquanto estiveste de sentinella?
FRANCISCO
Nem sequer ouvi correr um rato.
BERNARDO
Então boas noites; se vires Horacio e Marcello, que tambem estão de
guarda, dize-lhes que se aviem.
Chegam HORACIO e MARCELLO
FRANCISCO
Creio ouvil-os, façam alto, quem vem lá?
HORACIO
Amigos da patria.
MARCELLO
Subditos do rei de Dinamarca.
FRANCISCO
Santas noites.
MARCELLO
Viva, meu valente soldado, quem te rendeu?
FRANCISCO
Bernardo está agora de sentinella. Boa noite. (Retira-se.)
MARCELLO
Olá, Bernardo?
BERNARDO
Não é Horacio que eu vejo?
HORACIO
Elle mesmo em corpo e alma.
BERNARDO
Bemvindo sejas, Horacio, e tu tambem, amigo Marcello.
MARCELLO
Dize-me, já viste a apparição esta noite?
BERNARDO
Ainda nada vi.
MARCELLO
Horacio diz que é effeito da minha imaginação, e nega-se a acreditar na
visão temerosa, de que já por duas vezes fomos testemunhas; pedi-lhe
portanto que viesse comnosco, para que se o phantasma de novo apparecer,
elle possa testemunhar a verdade do que afiançâmos e dirigir-lhe a
palavra.
HORACIO
Historias, qual apparecer!
BERNARDO
Sentemo-nos um instante, e vamos repetir-te a narração do que temos
presenceado duas noites consecutivas e a que prestas tão pouco credito.
HORACIO
Com todo o gosto, e deixemos fallar Bernardo.
BERNARDO
A noite passada, á hora em que esta estrella que vêem ao poente do polo
descreve o seu giro e vem illuminar esta parte do firmamento, em que ora
brilha, no momento em que na torre soava uma hora, Marcello e eu...
MARCELLO
Silencio, eil-o que apparece.
Apparece a sombra do REI
BERNARDO
Assimilha-se ao defunto rei.
MARCELLO
Tu que estudaste, Horacio, falla-lhe.
BERNARDO
Não é verdade que se parece com o defunto rei? Observa bem, Horacio.
HORACIO
A similhança é espantosa; a surpreza e o terror paralysaram-me.
BERNARDO
Parece esperar que lhe fallem.
MARCELLO
Falla-lhe, Horacio.
HORACIO
Quem quer que és, que a esta hora da noite usurpas a fórma magestosa e
guerreira, debaixo da qual se mostrava o meu defunto soberano, em nome
do céu, falla, ordeno-to eu!
MARCELLO
Parece descontente.
BERNARDO
Eil-o que se afasta, caminhando lenta e gravemente.
HORACIO
Detem-te, falla, falla, intimo-te a que falles. (A sombra afasta-se.)
MARCELLO
Foi-se sem responder.
BERNARDO
Então, Horacio, que é essa tremura e pallidez; não haverá alguma cousa
mais do que um effeito de imaginação, que dizes agora?
HORACIO
Pelo Deus do céu, não o acreditava sem o testemunho positivo e
irrecusavel dos meus proprios olhos.
MARCELLO
Não se parece com o rei?
HORACIO
Como tu te pareces comtigo mesmo, era a armadura que usava quando
combateu o ambicioso norueguez; tinha aquelle ar ameaçador, no dia em
que no seu proprio carro, atacou, por causa de uma acalorada porfia, o
guerreiro polaco, e o prostrou no gêlo para nunca mais se levantar. É
assombroso!
MARCELLO
Assim é que elle já duas vezes passou pelo nosso posto de observação com
o seu caminhar grave e marcial.
HORACIO
Com que designio, ignoro-o, mas em minha opinião é um presagio para o
estado de alguma grande catastrophe.
MARCELLO
Pois bem, sentemo-nos, e aquelle d'entre vós todos que o souber, diga
porque fatigam, com guardas vigilantes e rigorosas, os subditos d'este
reino; para que esta fundição diaria de canhões de bronze, estas compras
de armamentos e munições no estrangeiro; para que se enchem de operarios
os nossos arsenaes maritimos; porque este augmento de trabalho, que nem
os dias santos são respeitados; para que esta actividade de dia e de
noite? O que será? Qual de vós m'o poderá dizer?
HORACIO
Posso eu, ao menos, referir os boatos. Nosso ultimo rei, cuja imagem
ainda ha pouco vimos, foi, segundo dizem, convocado a campo fechado por
Fortimbraz de Noruega, que um cioso orgulho tinha levado a esse acto.
N'esse combate o nosso valente Hamlet, e era justa a sua reputação,
matou a Fortimbraz. Ora em virtude de uma declaração authentica,
sanccionada pelas leis da cavallaria, se Fortimbraz succumbisse, todos
os seus estados pertenceriam ao vencedor. Por sua parte o nosso rei
tinha empenhado da mesma fórma a sua palavra; e no caso de elle ser
vencido, uma igual porção de territorio pertenceria a Fortimbraz. Assim,
em virtude d'este pacto reciproco, a successão do vencido pertencia de
direito a Hamlet. Comtudo o joven Fortimbraz, ardente e sem experiencia,
reuniu nas fronteiras de Noruega um exercito de aventureiros, promptos e
resolvidos pela soldada aos mais audaciosos commettimentos. O seu
projecto, segundo o nosso governo está informado, é nada menos do que
retomar á viva força e de mão armada esse territorio que seu pae perdeu
com a vida: eis-aqui, na minha fraca opinião, a rasão principal dos
preparativos que fazemos, das guardas a que somos obrigados, e d'esta
actividade tumultuosa que se nota em todo o paiz.
BERNARDO
Tambem eu julgo ser esse o motivo; isto explica-nos porque vemos passar
diante dos postos de guarda a sombra do rei, com a sua armadura e com o
seu porte magestoso, d'esse rei que foi e é o causador d'esta guerra.
HORACIO
É um argueiro nos olhos da intelligencia para lhes perturbar a vista.
Nos tempos mais gloriosos e florescentes de Roma, pouco antes da morte
do grande Julio, abriram-se os tumulos, e os mortos, nas suas mortalhas,
divagaram pela cidade, soltando gritos ameaçadores; viram-se estrellas
deixar após si rastos luminosos, choveu sangue, desastrosos signaes
appareceram no céu, e o astro humido, sob cuja influencia está o imperio
de Neptuno, eclipsou-se; todos julgavam ser o fim do mundo. Estes mesmos
signaes precursores de acontecimentos terriveis, correios de maus
destinos, preludios de grandes catastrophes, o céu e a terra os fizeram
apparecer nos nossos climas, aos olhos impressionaveis dos nossos
compatriotas.
A sombra reapparece
HORACIO continuando
Mas silencio, olhem, eil-o que volta. Vou interpellal-o, embora elle me
fulmine. Pára. Illusão. Se tens o dom da palavra, se pódes articular
sons, falla; se ha alguma boa acção cujo cumprimento te possa alliviar e
contribuir para a minha salvação, responde-me: se és sabedor de alguma
desgraça que ameace a tua patria, e que um aviso opportuno possa
desviar... Oh falla! ou se em tua vida confiaste ás entranhas da terra
riquezas mal adquiridas; e a maior parte das vezes é por isso que vós,
os espiritos, divagaes depois da morte, dil-o. (O gallo canta.) Detem-te
e falla. Veda-lhe o caminho, Marcello.
MARCELLO
Devo servir-me da minha partazana?
HORACIO
Serve-te se não parar.
BERNARDO
Para cá?
HORACIO
Por acolá. (A sombra afasta-se.)
MARCELLO
Partiu!--que presença magestosa!--são desacertadas estas demonstrações
violentas! é invulneravel como o ar, e os nossos golpes não são senão o
ridiculo esforço de uma colera impotente.
BERNARDO
Ia fallar quando cantou o gallo.
HORACIO
Estremeceu como um culpado que uma intimação subita aterra. Ouvi dizer
que o gallo, que é o clarim da aurora, acorda o Deus da manhã com a sua
voz sonora e penetrante, e que a esse signal todos os espiritos errantes
no mar, no fogo, na terra ou no ar se apressam em voltar aos seus
respectivos dominios. A prova está no que acabâmos de presencear.
MARCELLO
O gallo cantou, e elle desappareceu. Algumas pessoas dizem que na
vespera do dia em que se celebra a natividade do Salvador do mundo, o
arauto da manhã canta toda a noite sem interrupção; pretendem então que
nenhum espirito ousa saír da sua mansão, que as noites são salubres, que
nenhuma estrella exerce influencia maligna, nenhum maleficio surte
effeito, que nenhuma feiticeira exercita os seus feitiços, tanto esse
dia é bento, e está sob o imperio de uma graça celeste.
HORACIO
Assim o ouvi dizer, e acredito-o. Mas eis que no oriente, acolá no
fundo, por detrás dos outeiros, surge a manhã, vestida de purpura por
entre o orvalho. Demos fim á nossa vigilia, e vamos dar parte ao joven
Hamlet do que vimos esta noite; porque, por vida minha, creio que este
espirito, mudo para todos, lhe fallará. Approvam esta confidencia, que
nos impõe o nosso dever e a nossa affeição?
MARCELLO
Vamos sem detença; sei onde o acharemos, e onde lhe poderemos fallar sem
constrangimento. (Retiram-se.)
SCENA II
Uma sala apparatosa no castello
Entram o REI e a sua comitiva, a RAINHA, HAMLET, POLONIO, LAERTE,
VOLTIMANDO, CORNELIO e CORTEZÃOS
O REI
A morte de Hamlet, nosso amado irmão, ainda é tão recente, que pareceria
justo, que nossos corações estivessem immersos na tristeza e saudade, e
que uma nuvem de dor cobrisse o solo d'este reino; comtudo, a rasão
combateu os impulsos da natureza, tanto que enfreámos a nossa dor, e
embora ainda esteja bem viva a recordação, pensâmos tambem em nós.
Portanto, com um prazer incompleto, confundindo os sorrisos com as
lagrimas, a alegria com o luto; unindo o dobrar dos sinos aos canticos
nupciaes, tomámos por esposa aquella que outr'ora era nossa irmã, e
fizemol-a compartir comnosco a corôa d'este bellicoso paiz. N'esta
conjunctura ouvimos primeiro os vossos illustrados conselhos, livremente
enunciados. Somos-lhes gratos. Quanto ao joven Fortimbraz, fazendo
seguramente uma fraca idéa do nosso poder, ou imaginando que a morte de
nosso chorado irmão lançasse o estado na dissolução e na anarchia,
embalando-se em chimerica esperança, ousou mandar-nos mensagem após
mensagem, intimando-nos a restituir-lhe o territorio perdido por seu
pae, e legalmente adquirido por nosso valoroso irmão; isto por o que lhe
respeita. Fallemos agora de nós e do motivo d'esta reunião. O motivo é
este. Pelas presentes escrevemos ao rei de Noruega, tio do joven
Fortimbraz, que jazendo enfermo n'um leito, mal conhece os projectos de
seu sobrinho, pedindo-lhe que ponha o seu veto á empreza, porque é de
entre os seus subditos que se fazem as levas de soldados e os
alistamentos. Encarregámo-vos, Cornelio e Voltimando, de apresentar as
nossas saudações ao idoso monarcha norueguez, e é nossa vontade, que nas
negociações vos conformeis adstrictamente ás instrucções que junto com a
nossa carta recebereis. Adeus; a celeridade do resultado prove a
dedicação dos negociadores.
CORNELIO e VOLTIMANDO
Senhor, a nossa dedicação e obediencia não tem limites.
O REI continuando
Nem o duvidâmos. Recebam um cordeal adeus. (Cornelio e Voltimando sáem.)
Agora, tu, Laerte, que pretendes? Disseram-nos que nos querias fazer uma
supplica? Qual é? Tu não podes fazer ao monarcha dinamarquez um pedido
que não seja rasoavel, e não recorres a elle em vão. Que poderias
desejar, Laerte, a que não estejamos promptos a annuir, mesmo antes de
conhecer a pretensão. A cabeça não é mais sympathica ao coração, a mão
não é mais prompta em servir a bôca do que o throno de Dinamarca é
dedicado a teu pae. Que desejas pois, Laerte?
LAERTE
Meu augusto soberano, a vossa licença e o vosso consentimento, para
voltar a França. Gostosamente vim a Dinamarca para assistir á vossa
coroação, mas, cumprido esse dever, confesso-o, os meus desejos e a
minha vontade me chamam a França, e supplico a vossa magestade que me
conceda partir.
O REI
Já alcançaste o consentimento de teu pae? o que diz Polonio?
A RAINHA
Arrancou-me o meu consentimento, tanto me importunou; acabei por ceder,
mau grado meu, aos seus desejos. Supplico-lhe, pois, senhor, que lhe
conceda a licença pedida.
O REI
Podes partir quando te aprouver, Laerte; deixo-te a liberdade de
dispores do teu tempo e da tua pessoa. Então, Hamlet, meu primo, meu
filho?
HAMLET á parte
Aindaque mui proximos parentes não somos primos.
O REI
Porque essas nuvens que pesam sobre a tua fronte?
HAMLET
Engana-se, senhor, como póde haver nuvens, quando brilha o sol.
A RAINHA
Querido Hamlet, despe essas roupas de dó, e lança um olhar amigavel para
o rei de Dinamarca. Descrava os teus olhos do chão; pareces procurar as
pegadas do teu glorioso pae. Sabes bem que é um destino invariavel; tudo
quanto vive ha de morrer, e este mundo é uma ponte para a eternidade.
HAMLET
Sim, senhora, é um destino commum.
A RAINHA
Se é assim, o que te parece a ti tão extraordinario?
HAMLET
Senhora, não me parece, é-o na verdade. O parecer para mim nada vale.
Minha mãe, não são nem esta capa negra, nem estas vestes obrigadas nos
lutos solemnes, nem os suspiros que mal póde soltar um peito opprimido,
nem torrentes de lagrimas, nem o semblante macerado, nem todas as
manifestações de uma dor pungente, que podem exprimir e revelar o que eu
sinto. Todos estes signaes podem parecer dor; é um papel facil de
representar, mas não são verdadeira dor, são como o fato para o
comediante; mas eu (pondo a mão sobre o coração) sinto aqui, o que não
ha palavras que o expressem.
O REI
Nada ha na verdade, Hamlet, mais commovente e louvavel do que os deveres
funebres prestados á memoria de um pae. Mas lembra-te que teu pae já
perdêra o seu, e que esse tambem já perdêra o pae. E para o sobrevivente
um dever de piedade filial, dar durante um certo praso provas de uma dor
respeitosa; mas perseverar n'uma afflicção obstinada, é mostrar uma
teima impia; é uma dor cobarde, é a prova de uma vontade rebelde aos
decretos da providencia, de um coração sem energia, de uma alma incapaz
de resignação, de uma intelligencia pobre e limitada. Porque nos deve
impressionar a tal ponto um acontecimento, que sabemos ser uma
necessidade, e que se repete tão frequente, quanto as occorrencias mais
vulgares; é uma triste indocilidade. Que!! É uma offensa a Deus, uma
offensa aos finados, uma absurda offensa á natureza, que não tem em seus
fastos mais vulgar acontecimento, que a morte de um pae; a qual, desde o
primeiro cadaver até ao homem que hoje se finou, nunca deixou de nos
clamar: Assim estava escripto. Supplico-te, portanto, abandona essa
afflicção impotente, e vê em nós um segundo pae; porque queremos que
todos saibam que tu és o mais proximo ao nosso throno, e que a affeição
mais terna que um pae tem a seu filho, tenho-a eu a ti. Quanto á tua
intenção de voltar a Wittemberg, para continuares os teus estudos, nada
ha mais opposto aos nossos desejos; conjurâmos-te que fiques aqui, sê o
prazer de nossos olhos, o primeiro da nossa côrte, nosso sobrinho, nosso
filho.
A RAINHA
Hamlet, far-te-ha tua mãe uma supplica baldada? peço-te fica comnosco,
não vás para Wittemberg.
HAMLET
Farei o que podér, para em tudo vos provar obediencia.
O REI
Eis emfim uma resposta affectuosa e comedida. Serás na Dinamarca um
segundo _Eu_. (Á rainha) Venha, senhora, este acto de deferencia de
Hamlet, cumprido tão naturalmente e sem esforço, enche de jubilo o meu
coração. Para o celebrar o rei de Dinamarca não libará uma taça, sem que
a voz do canhão o transmitta ás nuvens. A cada taça quero que o céu o
annuncie, repercutindo o estrondo dos raios da terra. Vamos agora.
(Todos sáem excepto Hamlet.)
HAMLET só
Ah! porque não poderá esta carne tão solida fundir-se e tornar-se
orvalho. Ah que se o Eterno não tivesse fulminado como reprobo o
suicida... Senhor Deus, meu Deus, como são insipidos, fastidiosos e vãos
os gosos do mundo. Que pena! Elle é um jardim inculto que só tem plantas
grosseiras e maleficas. Pois será possivel que ousassem tanto? Morto ha
dois mezes! que digo? Nem dois mezes ainda. Um rei tão bom, que tanta
similhança tinha com este como Hyperion com um Satyro, todo ternura para
minha mãe, a ponto de não querer que uma brisa mais fresca açoutasse o
seu rosto! Céus e terra! e deverei eu recordar-me? Parecia que a vida de
um era a vida do outro! Comtudo, passado apenas um mez--não posso nem
quero pensal-o--, fragilidade é synonymo de mulher. Só um mez, sem ainda
ter gasto o calçado que usava acompanhando o feretro do marido, banhada
em lagrimas como uma Niobe, ella mesma, essa mulher, oh céus! um animal
privado do soccorro da rasão teria prolongado o seu luto; essa mulher
desposou meu tio, o irmão de meu pae, mas que tem tanto de meu pae como
eu de Hercules. No fim de um mez, antes que seccassem as suas hypocritas
lagrimas, casou. Oh criminosa precipitação! Voar com tanto afan a um
leito incestuoso, é horrivel! E será possivel que o céu o tolere?
Despedaça-te coração, já que forçoso é calar.
Chegam HORACIO, BERNARDO e MARCELLO
HORACIO
Deus guarde a Vossa Alteza.
HAMLET
Quanto folgo de te ver de boa saude. És tu, Horacio, não me engano.
HORACIO
Eu mesmo, o vosso servo fiel até á morte.
HAMLET
Queres dizer _amigo_; de hoje em diante dar-te-hei este nome. Mas que
fazes tu longe de Wittemberg, Horacio? Marcello.
MARCELLO
Meu principe!
HAMLET
Alegro-me de te ver, bons dias. (A Horacio.) Mas, francamente, que
motivo te obrigou a voltar de Wittemberg?
HORACIO
Tudo dissipei.
HAMLET
Nunca consentiria que um teu inimigo assim fallasse a teu respeito; e
não me obrigarás a forçar a minha rasão a crer no que o meu coração se
nega a acreditar. Accusares-te d'esta maneira a ti mesmo... tu não és
dissipador. Que motivo tão forte te pôde pois trazer a Elsenor, tu m'o
contarás mais tarde, entre dois copos de vinho generoso, antes da tua
partida.
HORACIO
Senhor, vim prestar a ultima homenagem a seu augusto pae.
HAMLET
Peço-te, meu camarada de estudos, que não zombes; creio antes que vieste
assistir ao casamento de minha mãe.
HORACIO
Verdade é que não houve quasi intervallo.
HAMLET
Por alvitre economico, Horacio. O banquete funerario ainda subministrou
as iguarias e as viandas para o festim nupcial. Antes quizera encontrar
no céu o meu mais encarniçado inimigo, do que ter visto despontar um tal
dia, Horacio. Meu pobre pae, parece-me que o estou vendo!
HORACIO
Onde, senhor?
HAMLET
Na minha imaginação, Horacio.
HORACIO
Recordo-me de o ter visto, era um grande rei.
HAMLET
Era um homem que, bem considerado, não tinha rival na terra.
HORACIO
Julgo tel-o visto a noite passada.
HAMLET
Viste, quem?
HORACIO
Alteza, vi o rei seu pae.
HAMLET
O rei meu pae?
HORACIO
Senhor, acalme esta agitação e espanto, e preste attenção, emquanto eu,
fundado no testemunho ocular d'estes senhores, vou relatar esse
prodigio.
HAMLET
Falla, pelo amor de Deus, sou todo ouvidos.
HORACIO
Durante duas noites consecutivas, no meio das trevas e do silencio,
emquanto estes senhores estavam de sentinella, eis o que lhes aconteceu.
Uma figura parecida com seu pae, armada da cabeça aos pés, lhes
appareceu caminhando lenta e magestosamente. Tres vezes, atemorisados e
attonitos, o viram passar á distancia do bastão de commando que
empunhava, emquanto elles, fulminados pelo terror, ficaram mudos, nem
ousaram fallar. Confiaram-me, debaixo de segredo, tremulos ainda, o que
tinham presenceado. Na noite seguinte entrei com elles de sentinella, e
confirmando a verdade das suas palavras, á hora por elles indicada,
debaixo da fórma por elles descripta, voltou a apparição. Reconheci seu
pae; as minhas duas mãos não são mais parecidas.
HAMLET
Mas em que sitio appareceu?
MARCELLO
Senhor, na explanada, onde estavamos de sentinella.
HAMLET
Fallaram-lhe.
HORACIO
Fallámos, mas não respondeu. Comtudo uma vez pareceu-me que movia a
cabeça, como quem quer fallar; mas n'esse momento cantou o gallo
matinal; ao som do canto afastou-se o espectro apressadamente, e nós
perdemol-o de vista.
HAMLET
Na verdade é incomprehensivel.
HORACIO
Senhor, juro-lhe pela minha vida que é verdade, e julgámos nosso dever
informar Vossa Alteza.
HAMLET
Não posso dissimular a minha inquietação! Estão de guarda esta noite?
TODOS
Sim, Alteza.
HAMLET
Armado, disseram?
TODOS
Armado, meu senhor.
HAMLET
Da cabeça aos pés?
TODOS
Tal qual.
HAMLET
Viram-lhe as feições?
TODOS
Vimos, tinha a viseira levantada.
HAMLET
Tinha physionomia carregada?
TODOS
A expressão era antes triste que colerica.
HAMLET
Pallido ou córado?
TODOS
Muito pallido.
HAMLET
O seu olhar fixou-se em algum de vós?
TODOS
Constantemente.
HAMLET
Queria lá ter estado.
HORACIO
O seu espanto teria sido igual ao nosso.
HAMLET
É mais que provavel. Demorou-se muito?
HORACIO
O tempo necessario para contar até _um cento_, sem parar.
MARCELLO e BERNARDO
Muito mais, muito mais.
HORACIO
Não a vez que o vi.
HAMLET
A barba era grisalha, não é verdade?
HORACIO
Era, como em sua vida, de um negro prateado.
HAMLET
Velarei tambem esta noite, talvez que volte.
HORACIO
Sem duvida alguma.
HAMLET
Se se me apresentar debaixo da figura de meu pae, fallar-lhe-hei, embora
o inferno me ordenasse o silencio, pelas suas horrendas fauces.
Peço-vos, portanto, que se até hoje tendes guardado um segredo tal a
respeito da apparição, de hoje em diante sejaes ainda mais cautelosos em
conservar o sigillo; e aconteça o que acontecer esta noite, reflexão e
silencio: serei grato a esta prova de affeição. Assim, pois, adeus,
encontrarme-hei comvosco na explanada entre as onze horas e a meia
noite.
TODOS
Os nossos respeitos, principe.
HAMLET
Sempre amigos, adeus. (Horacio, Marcello e Bernardo sáem.)
(Continuando.) A sombra de meu pae, porque apparece armada? Haverá algum
perigo. Suspeito alguma traição. Espero impacientemente a noite. Até
então, socega coração. Não ha crimes tão occultos, que o homem não possa
descobrir. (Sáe.)
SCENA III
Um quarto em casa de Polonio
Entram LAERTE e OPHELIA
LAERTE
Já embarcaram os meus creados e roupas. Adeus, minha irmã; quando ventos
propicios encherem as vélas ao navio que me leva, espero que com a minha
ausencia não esfriará a tua amisade, e que me darás novas tuas.
OPHELIA
Duvídas porventura, irmão?
LAERTE
Quanto ao que respeita a Hamlet e á sua frivola amisade, considera-a
como uma moda ephemera, um capricho dos sentidos, uma violeta da
primavera, precoce mas passageira, suave mas fenecendo ao desabrochar, e
cujo perfume dura um minuto apenas.
OPHELIA
Só um minuto?
LAERTE
Só, acredita-me, porque o teu desenvolvimento não é só nos musculos e no
corpo; á medida que o templo toma proporções mais vastas, tambem se
expande o espirito e a alma. É possivel que te ame agora, que nenhuma
macula, nenhuma deslealdade offusque a pureza dos seus sentimentos; mas
acautela-te, porque na posição que occupa é-lhe vedada a propria
vontade, é escravo do seu nascimento. Não póde, como os outros homens,
escolher só por affeição, porque á sua escolha estão ligados o bem-estar
e a salvação do estado; por isso deve subordinal-a ao voto e á
approvação da nação de que é chefe. Se, pois, te fallar de amor,
assisadamente usarás, não acreditando senão o que a sua posição lhe
permitte offerecer, vistoque a sua vontade deve ser a vontade da nação.
Pensa bem, que mancha para a tua reputação, se prestasses ouvidos por
demais credulos, ao encanto das suas fallas, se envenenasses tua alma,
se abrisses o cofre da castidade ás suas audaciosas instancias.
Acautela-te, Ophelia, acautela-te, querida irmã, luta com a tua affeição
para vencer as settas e os perigos dos desejos. A virgem prudente já é
assás prodiga se patenteia a sua belleza aos raios lunares; a propria
virtude não escapa aos golpes da calumnia; o verme roe as filhas
predilectas da primavera, antes das flores desabrocharem; e é na aurora
da vida, regada pelo puro e limpido orvalho, que ha mais perigo para a
flor da castidade. Sê, pois, circumspecta, a melhor protecção é o receio
do perigo; a juventude é para si mesma um perigo, se não trava luta com
outros maiores.
OPHELIA
Em meu coração encerrarei, como um preservativo, a tua salutar lição.
Mas, querido irmão, não sejas tu, como certos pastores sem virtude, que
indicam ás suas ovelhas o caminho escarpado e espinhoso que conduz ao
céu, emquanto elles, libertinos, fogosos e sem pudor, trilham o caminho
das flores, da licença, e são a antithese das suas palavras.
LAERTE
De mim não te arreceies: já devia ter partido; eis meu pae.
Entra POLONIO
Uma dupla benção é um beneficio duplo; abençôo a occasião de me despedir
segunda vez de ti.
POLONIO
Ainda aqui, Laerte? para bordo, para bordo. Não te envergonhas? Teu
navio só te espera para velejar. Recebe a minha benção, e grava na tua
memoria os seguintes preceitos. Guarda para ti o pensamento, e não dês
execução apressadamente aos teus projectos; medita-os maduramente. Sê
lhano sem te esqueceres de quem és. Quando tomares um amigo cuja
affeição tenhas experimentado, liga-o a ti por vinculos de aço; mas não
dês confiança irreflectidamente. Faze por evitar questões; mas se o não
podéres conseguir, conduze-te de maneira que fiques sempre superior ao
teu adversario. Ouve a todos, mas sê avaro de palavras; escuta o
conselho que te derem, forma depois o teu juizo. No teu trajar sê tão
sumptuoso, quanto t'o permittam os teus meios, mas nunca affectado;
rico, mas não offuscante; o porte dá a conhecer o homem, e n'esse ponto,
as pessoas de qualidade em França revelam um gosto primoroso, e o mais
fino tacto. Não emprestes, nem peças emprestado: quem empresta perde o
dinheiro e o amigo, e o pedir emprestado é o primeiro passo para a
ruina. Mas sobre tudo sê verdadeiro para a tua consciencia, e assim como
a noite se segue ao dia, seguir-se-ha tambem, que o teu coração jamais
abrigará falsidade. Adeus, que a minha benção selle em teu coração os
meus conselhos.
LAERTE
Despedindo-me, humildemente vos beijo a mão, meu pae.
POLONIO
Não tens tempo que perder, teus creados esperam-te.
LAERTE
Adeus, Ophelia, recorda-te das minhas palavras.
OPHELIA
Fechei-as no meu coração; dou-te a chave, guarda-a.
LAERTE
Adeus. (Sáe.)
POLONIO
Que te disse elle, Ophelia?
OPHELIA
Com licença de meu pae, fallou-me a respeito de Hamlet.
POLONIO
Folgo que o fizesse. Disseram-me que ultimamente Hamlet tem tido comtigo
frequentes entrevistas, e que tu não te esquivas ás suas frequentes
visitas. Se assim é, e creio na informação que me deram, devo dizer-te
que não encaras a tua posição com a lucidez que convem a minha filha, e
que a tua honra exige. Dize-me a verdade, o que ha?
OPHELIA
Protestos de amor.
POLONIO
De amor! como inexperiente fallas, conservas as illusões todas. Dás tu
porventura credito aos seus protestos, como tu lhe chamas?
OPHELIA
Nem sei, senhor, o que devo pensar.
POLONIO
Pois bem, eu t'o digo. É necessario que sejas bem creança para crer uma
realidade os seus protestos, de cuja sinceridade devéras duvido. Não te
deprecies assim; seria uma loucura.
OPHELIA
O seu respeito foi inseparavel das suas phrases de amor.
POLONIO
E tu acreditas, pobre louca.
OPHELIA
Firmou as suas palavras com os juramentos mais sagrados.
POLONIO
Assim arma o caçador os laços á avesinha innocente e incauta. Sei que,
quando o sangue ferve, a nossa bôca nunca se nega a protestos e
juramentos. Minha filha, estes lampejos que dão mais luz que calor, e
cujo brilho é ephemero, nunca os tomes por verdadeira chamma de amor. A
datar de hoje, não malbarates tanto a tua presença virginal; difficulta
mais as entrevistas, que não baste pedir para as obter. Quanto ao sr.
Hamlet e á confiança que n'elle podes ter, considera que é joven, e que
póde tomar liberdades de que depois tenhas que te arrepender. N'uma
palavra, Ophelia, descrê dos seus juramentos, porque não são
verdadeiros; interpretes de desejos profanos, revestem-se da linguagem
da mais santa sinceridade. Uma vez por todas, e franqueza, filha,
prohibo-te toda e qualquer conversa com o sr. Hamlet. Pensa bem.
Ordeno-t'o.
OPHELIA
Obedecerei, meu pae. (Sáem.)
SCENA IV
A explanada do castello de Elsenor
Chegam HAMLET, HORACIO e MARCELLO
HAMLET
Que frio horrivel, gélo.
HORACIO
O ar está devéras glacial.
HAMLET
Que horas são?
HORACIO
Não deve tardar a meia noite.
MARCELLO
Está dando meia noite.
HORACIO
Já! não ouvi, em todo o caso approximâmo-nos da hora a que costuma
apparecer o phantasma. (Ouvem-se ao longe tangeres de instrumentos, e o
troar de artilheria.) Que rumor é este?
HAMLET
O rei consagra esta noite ao prazer, está bebendo, e a cada copo de
vinho do Rheno, os timbales e clarins proclamam o brinde que levantou.
HORACIO
Isso é costume?
HAMLET
Sim é, mas apesar de eu ter nascido n'este paiz, e estar acostumado a
estes usos, ha emquanto a mim mais gloria em infringil-os, do que em
observal-os. Estas orgias abjectas trazem-nos, do oriente ao occidente,
o desprezo das outras nações, que nos qualificam de ebrios, e juntam aos
nossos nomes os epithetos mais grosseiros. Este defeito embaça as nossas
mais brilhantes qualidades, e tira-lhes todo o valor. O mesmo acontece
aos individuos. Se ao nascerem, receberam da natureza alguma macula
original, de que não são culpados, poisque o nascimento é independente
da nossa vontade; se os afflige algum vicio de temperamento contra o
qual todos os esforços da rasão são impotentes, algum costume que
desagrade nos seus modos destruindo-lhes o encanto; acontece a esses
homens, tendo o estigma de um defeito unico, libré da natureza, sêllo da
sua estrella, acontece, digo, que todas as suas virtudes, fossem ellas
puras como a graça celeste, infinitas quanto comporta á humanidade,
ficariam manchadas na opinião, publica por esse defeito unico. Basta uma
mollecula de liga para depreciar esse metal.
Apparece a sombra
HORACIO
Senhor, eil-o.
HAMLET
Anjos do céu, poderes misericordiosos, protegei-nos. Genio bemfazejo, ou
demonio infernal, que exhalas os perfumes celestes, ou as emanações do
averno; que sejam sinistras ou caridosas as tuas intenções, appareces-me
debaixo de uma fórma tão grata que te quero fallar. Interrogo-te,
Hamlet, senhor, meu pae, rei de Dinamarca, oh! responde-me, não me
deixes, na ignorancia, morrer de emoção; mas dize-me, porque teus bentos
ossos encerrados no ataude romperam os sellos; porque te levantaste do
tumulo em que te haviamos depositado; porque se ergueu a lapide
sepulchral para te lançar a este mundo? Como, cadaver inanimado,
vestindo a tua armadura de aço, vagueias tu á duvidosa claridade da lua,
imprimindo á noite um caracter de horror, lançando-nos, fracos ludibrios
da natureza, nas ancias do terror; e fazendo surgir em nossas almas
pensamentos que excedem o nosso alcance? Responde. Porque? Com que fim?
Que exiges?
HORACIO
Faz-vos signal de o seguir, como se quizesse fallar-vos a sós.
MARCELLO
Veja, principe, o gesto cheio de cortezia e dignidade, com que o convida
a seguil-o a logar mais remoto; mas não vá.
HORACIO
Senhor, pelo amor de Deus.
HAMLET
Quer-me fallar, pois bem, seguil-o-hei.
HORACIO
Não faça tal, senhor.
HAMLET
Porque? que tenho eu a receiar, importa-me tanto a vida, como se fosse
um alfinete; quanto á minha alma, nada póde contra ella, porque é
immortal, como elle é. Repete o signal, vou seguil-o.
HORACIO
E se elle vos attrahisse ao Oceano ou ao pincaro escarpado de algum
rochedo saliente e sobranceiro ao mar; e se tomasse alguma fórma
horrivel, cuja vista vos varresse a rasão tornando-vos demente? Pensae
bem, senhor, não receiaes alguma vertigem ao contemplar de alto a
immensidade debaixo de vossos pés?
HAMLET
Continua a fazer-me signal. Caminha, sigo-te.
MARCELLO
Não ha de ir, senhor.
HAMLET
Ninguem me detenha.
HORACIO
Seja rasoavel, principe, não vá.
HAMLET
Ouço a voz do meu destino; brada alto, e cada um dos meus musculos
adquiriu o vigor dos do leão de Nemea. (A sombra faz-lhe signal de a
seguir.) Chama-me outra vez, deixem-me, senhores (escapa-se-lhes dos
braços.) Por Deus, que não viverá, quem ousar oppôr-se-me. Afastem-se,
já disse. (Á sombra.) Caminha, sigo-te. (A sombra e Hamlet afastam-se.)
HORACIO
Apoderou-se d'elle o delirio.
MARCELLO
Sigamol-o; desobedecer-lhe é forçoso n'estas circumstancias.
HORACIO
Não o abandonemos. Qual será o resultado!
MARCELLO
Algum vicio ha na constituição da Dinamarca.
HORACIO
O céu proverá o que for melhor.
MARCELLO
Sigamos o principe. (Sáem todos.)
SCENA V
Uma parte mais afastada da explanada
Chegam HAMLET e a SOMBRA
HAMLET
Onde pretendes conduzir-me; mais adiante não irei.
A SOMBRA
Encara-me, Hamlet.
HAMLET
Que queres?
A SOMBRA
Approxima-se a hora em que me devo recolher ás chammas sulphureas e
ardentes.
HAMLET
Pobre alma!
A SOMBRA
Não me lastimes, mas presta attenção ao segredo que te vou revelar.
HAMLET
Falla, é meu dever escutar-te.
A SOMBRA
Dever tambem é vingar-me depois de me teres ouvido.
HAMLET
Que ouço!
A SOMBRA
Sou a alma de teu pae, condemnada a penar durante um tempo certo, a
jejuar n'um carcere de chammas, até que as culpas que mancharam a minha
vida estejam completamente expiadas e purificadas pelo fogo. Se não me
fosse defezo revelar os segredos do meu carcere, far-te-ía uma narrativa
de que cada palavra encheria de terror a tua alma, gelaria o teu sangue,
os olhos quaes estrellas brilhantes saíriam das suas orbitas, os anneis
do teu cabello desfazer-se-íam em completa desordem, e cada cabello
ficaria hirto como as cerdas do javali; mas estes mysterios eternos não
são para ouvidos profanos de carne e de sangue. Escuta, escuta, oh
escuta-me! se alguma vez amaste teu carinhoso pae...
HAMLET
Oh céus!
A SOMBRA
Vinga a sua morte, causada por um assassinio, cobárde, infame e nefando.
HAMLET
Um assassinio?
A SOMBRA
Infame! todos os assassinios o são, mas nunca houve nenhum mais infame,
inaudito e horrendo do que este.
HAMLET
Apressa-te em desvelar-m'o, para que prompto, como a meditação, ou como
o pensamento de amor, possa saciar a minha vingança.
A SOMBRA
Grato sou ao teu empenho, Hamlet; era preciso que fosses mais apathico
do que a planta grossa e crassa que immovel e inerte apodrece nas
margens do Lethes, se não sentisses n'este momento commoção alguma.
Agora, ouve-me. Espalhou-se que emquanto dormia no meu jardim, uma
serpente me mordêra; é assim que uma fallaz narrativa enganou a
Dinamarca sobre a causa da minha morte. Sabe tu pois a verdadeira, nobre
mancebo: a serpente cujo dardo matou teu pae, cinge hoje a corôa d'este
reino.
HAMLET
Oh meus propheticos presentimentos, meu tio!
A SOMBRA
Sim, esse monstro, incestuoso, adultero pela magia das palavras, pelos
dotes insidiosos. Oh loquela perversa, oh dotes nefarios, poisque tem
tal poder de seducção, e conseguiu inspirar essa vergonhosa paixão a
minha mulher, apparentemente tão virtuosa. Oh! Hamlet, que degradação!
Descer de mim, cujo amor nobre e digno não tinha desmentido um instante
o juramento prestado junto ao altar, a um miseravel, entre cujas
qualidades naturaes e as minhas havia um abysmo! Mas assim como a
virtude resiste inabalavel ás tentações do vicio, aindaque debaixo da
fórma da Divindade lhe apparecesse, assim tambem a impudicicia, embora
associada a um anjo celeste de luz, cansa-se da santidade do leito
conjugal, para ir habitar o mais desprezivel prostibulo. Mas já sinto a
frescura da aurora, forçoso é que eu termine. Emquanto dormia no meu
jardim, era esse o meu costume todas as tardes; teu tio, aproveitando a
minha inconsciencia, approximou-se de mim, munido de um frasco de
meimendro, e lançou-me n'um ouvido o conteúdo. É um veneno tão activo
para o sangue humano, que com a subtileza do mercurio corre e se
infiltra em todos os canaes, em todas as veias, coalhando e alterando o
sangue pela sua acção energica: o mais puro e limpido não lhe resiste, é
como uma gotta de qualquer acido n'uma taça de leite. Tal foi o seu
effeito, que uma lepra instantanea cobriu meu corpo de uma crosta impura
e infecta. Eis como durante o meu somno, tudo me foi arrebatado de uma
vez, e pela mão de um irmão, vida, corôa e consorte. A morte
surprehendeu-me em estado flagrante de peccado; sem sacramentos, sem me
reconciliar, nem com Deus, nem com a minha consciencia; tinha que
comparecer perante o Juiz Supremo vergando sob o peso das minhas
iniquidades. Horror, horror, cumulo de horror! Se em teu coração vibra a
fibra da sensibilidade, não o toleres. Não consintas que o leito do rei
de Dinamarca se transforme em mansão da luxuria e do incesto. Mas seja
qual for a tua vingança, conserva-te moral e puro, e poupa tua mãe.
Entrega o seu castigo ao céu, e aos espinhos do remorso que lhe
dilaceram o coração. Adeus, cumpre-me deixar-te; a luz do perilampo,
cujo fogo sem calor começa a esmorecer, annuncia a approximação da
aurora. Adeus, adeus, adeus. Recorda-te sempre de mim. (A sombra
retira-se.)
HAMLET
Oh! santas legiões do céu, oh! terra, que mais? Invocarei o inferno? Oh!
opprobrio; contém-te, ah! contém-te, meu coração, e vós, meus musculos,
não percaes o vigor, e redobrae de força e energia para me suster.
Recordar-me de ti? Sim, sombra infeliz, emquanto a memoria não abandonar
este meu cerebro desordenado. _Recorda-te de mim_; sempre! quero varrer
da minha memoria todas as recordações frivolas, todas as maximas
colhidas nos livros, todos os vestigios, todas as impressões do passado,
tudo quanto a juventude e a observação coordenaram, e em sua vez dar só
lugar, sem rivaes, juro-o pelo céu, aos teus preceitos. Oh! mulher
perversa, oh infame e damnado monstro! oh memoria, grava bem o seguinte,
que nos sorrisos do homem se póde occultar um crime; assim é na
Dinamarca (escreve n'uma carteira). Meu tio, espere-me. A minha senha
será de hoje em diante. _Adeus, adeus, adeus. Recorda-te de mim._
Jurei-o.
HORACIO ao longe
Senhor, senhor?
MARCELLO ao longe
Senhor Hamlet?
HORACIO
Que o céu o proteja.
HAMLET
Assim seja.
MARCELLO ao longe
Olá, olá, senhor!
HAMLET
Pousa meu falcão, pousa. (Imita o canto do falcão e o chamamento do
falcoeiro.)
Chegam HORACIO e MARCELLO
MARCELLO
O que se passou, senhor?
HORACIO
Que novas, senhor?
HAMLET
As mais extraordinarias.
HORACIO
Conte-nol-as, principe.
HAMLET
É um segredo.
HORACIO
E não sou eu capaz de o guardar? O principe conhece-me.
MARCELLO
E eu?
HAMLET
Que me dirão quando o souberem: que coração humano o teria pensado.
Juram-me segredo?
HORACIO e MARCELLO
Jurâmos.
HAMLET
Não ha em toda a Dinamarca um scelerado igual.
HORACIO
Era necessario que um espectro saísse do tumulo para nol'o dizer?
HAMLET
É verdade, têem rasão. Basta de palavras, um aperto de mão, e cada um
volte onde o chamam os negocios e as suas inclinações, porque todos têem
inclinações e negocios, sejam quaes forem: eu, pobre pária do mundo, vou
orar.
HORACIO
São palavras incoherentes e sem sentido, alteza.
HAMLET
Peza-me que te offendesses, peza-me devéras.
HORACIO
Em que, senhor?
HAMLET
Por S. Patricio, que te offendi e gravemente. Quanto á apparição de inda
agora, é um phantasma honesto, digo-t'o eu. Quanto ao desejo de
conhecerem, senhores, o que entre nós se passou, reprimam-n'o. E agora,
meus bons amigos, em nome da nossa amisade, da nossa camaradagem de
estudos e de armas, façam-me um favor.
HORACIO
Qual é? Não hesitâmos.
HAMLET
Nunca digam o que viram esta noite.
AMBOS
Conte com a nossa palavra, principe.
HAMLET
Quero um juramento.
HORACIO
Prometti o segredo.
MARCELLO
Já jurámos.
HAMLET
Mas jurem sobre a minha espada.
A SOMBRA (debaixo da terra)
Jurem.
HAMLET
Ah! ah! meu camarada, és tu que fallas; estás ahi, meu valente,
approxima-te; ouvem a sua voz, prestem o juramento.
HORACIO
Diga-nos a formula, principe.
HAMLET (afastando-se um pouco com elles)
Jurem sobre a minha espada, que guardarão sigillo do que viram e
ouviram.
A SOMBRA (debaixo da terra)
Jurem.
HAMLET
_Hic et ubique._ Vamos para mais longe. (Afastam-se um pouco.)
Approximem-se, e estendendo a dextra sobre a minha espada, jurem por
este gladio nunca revelar o que viram e ouviram.
A SOMBRA (debaixo da terra)
Jurem pela sua espada.
HAMLET
Bravo, velha toupeira, como caminhas depressa subterraneamente, que
bello mineiro! Afastemo-nos mais uma vez, meus bons amigos.
HORACIO
Por vida minha, é prodigioso!
HAMLET
Acolhâmol-o como se acolhe um estrangeiro. O céu e a terra encerram mais
mysterios, que os conhecidos pelos philosophos; mas venham. Notem o que
notarem nos meus modos, se eu julgar necessario affectar maneiras
extravagantes, jurem-me pela sua salvação que nunca cruzarão os braços,
meneando a cabeça, nem lhes escaparão palavras ambiguas, como por
exemplo: _Muito bem, muito bem_--_já sabemos_--ou--_se quizessemos
fallar_--ou--_ainda ha pessoas que se ousassem_--ou outras expressões
equivocas, dando a perceber que estão na confidencia; jurem que nada
farão; e possa, quando mais precisarem, não lhes faltar a graça divina.
A SOMBRA (debaixo da terra)
Jurem.
HAMLET
Acalma-te, alma penada. Assim, senhores, recommendo-me á vossa affeição,
e tudo quanto um homem tão debil como Hamlet possa fazer para lhes
provar o seu affecto, fal-o-ha com a ajuda de Deus. Retiremo-nos juntos,
e silencio; peço-lh'o eu. Ha no mundo alguma grande perturbação.
Maldição. Porque serei eu o eleito para a terminar? Vamos, partâmos
juntos.
Fim do acto primeiro
ACTO SEGUNDO
SCENA I
Uma sala em casa de Polonio
Entram POLONIO e RINALDO
POLONIO
Rinaldo, entrega a meu filho este dinheiro e estas letras.
RINALDO
Sim, meu senhor.
POLONIO
Mas antes de o procurar, obrarás assisadamente tomando informações a seu
respeito.
RINALDO
Era essa a minha intenção.
POLONIO
Bem, muito bem; toma antes todas as informações pelos dinamarquezes que
estão em París, vê as suas relações, e com quem se dão, quaes os seus
gastos; depois de te assegurares pelas tuas perguntas que conhecem meu
filho, procura colher informações mais exactas, sem comtudo o dar a
entender. Dissimula que o conheces perfeitamente, dizendo, por exemplo:
Conheço o pae e a familia, mas d'elle não tenho conhecimento algum.
Entendes, Rinaldo?
RINALDO
Perfeitamente, senhor.
POLONIO
De todo não me é desconhecido, pódes acrescentar. Conheço-o pouco é
verdade, comtudo aquelle de quem fallo é um dissipador com todos os seus
defeitos; imputa-lhe então todos os vicios que te parecer, excepto
aquelles que podem deshonrar um homem, toma conta n'isso; só as loucuras
e imprudencias proprias de um joven que se sente livre de todo o
constrangimento paterno.
RINALDO
O jogo, talvez?
POLONIO
Bem, e as bebidas, a esgrima, as pragas, o genio buliçoso, a convivencia
do prostibulo, é até onde te auctoriso que chegues.
RINALDO
Actos são, na verdade, que não deshonram.
POLONIO
Sabes bem como te deves haver fazendo estas imputações. Não aggraves os
factos accusando-o de devassidão continua e habitual; não pretendo tal;
censura-o mas com discrição; exprime-te como se attribuisses as suas
faltas aos defeitos inherentes á mocidade, ao abuso da liberdade, ao
arrebatamento de um espirito fogoso, á effervescencia de um sangue
ardente.
RINALDO
Mas, senhor?
POLONIO
Porque será conveniente obrar assim.
RINALDO
Para lh'o perguntar estava eu.
POLONIO
É onde eu queria chegar, e na minha opinião é um ardil sem igual. Depois
de teres imputado a meu filho esses ligeiros defeitos, que se podem
considerar quando muito como imperfeições n'uma bella obra; se o teu
interlocutor, aquelle que queres sondar, notou no joven a que te referes
algum dos vicios mencionados, está certo que responderá immediatamente:
Meu caro senhor, ou _meu amigo_--ou _meu cavalheiro_--segundo o costume
do individuo, ou o uso do paiz...
RINALDO
Prosiga, senhor.
POLONIO
Então... que estava eu dizendo? pela santa missa--que queria eu dizer? o
que era?
RINALDO
Fallava da resposta...
POLONIO
Que te darão, é isso, e não deixarão de responder: _Conheço esse
mancebo, vi-o ainda hontem, ou outro qualquer dia, em tal epocha, com
estes ou com aquelles, surprehendi-o jogando, ou n'uma orgia ou numa
rixa_, ou ainda, _vi-o entrar n'uma casa suspeita_; ou outras cousas
similhantes: agora vês como com a mentira se colhe a verdade. É assim
que nós, as pessoas entendidas, empregâmos a miudo o embuste e a
falsidade para descobrir a verdade. Ahi está o caminho que seguirás para
saber o comportamento de meu filho. Percebes agora?
RINALDO
Sim, meu senhor.
POLONIO
O Senhor seja comtigo, boa viagem.
RINALDO
Meu amo!
POLONIO
Observa tu mesmo as suas inclinações.
RINALDO
Fal-o-hei, senhor.
POLONIO
Mas não o distráias da sua vida.
RINALDO
Bem entendo.
POLONIO
Adeus. (Rinaldo sáe.)
Entra OPHELIA
POLONIO
Que te traz por aqui, Ophelia?
OPHELIA
Meu pae, meu pae, ainda tremo.
POLONIO
Porque? Falla por piedade.
OPHELIA
Querido pae, estava no meu quarto trabalhando em costura, quando de
repente deparo com o sr. Hamlet, mas em que estado! as vestes em
desordem, o cabello em desalinho, as meias caídas arrastavam pelo chão,
pallido e branco como uma mortalha, tremiam-lhe as pernas, o rosto tinha
a expressão do desespero, qual profugo do inferno mensageiro de novas
horriveis.
POLONIO
Enlouqueceria por tua causa?
OPHELIA
Não sei, meu pae, mas receio-o devéras.
POLONIO
Que te disse elle, Ophelia?
OPHELIA
Tomou-me os pulsos, apertando-os convulsivamente, depois afastando-se á
distancia do seu braço, levando a mão á testa, fitou os olhos no meu
rosto, como se me quizesse retratar. Assim se demorou por largo tempo,
por fim saccudindo-me levemente o braço, levantando e baixando por tres
vezes a cabeça, suspirou tão profundamente, que todo o seu corpo
estremeceu, parecia o prenuncio da morte. Feito isto, deixou-me, partiu
e desviando a cabeça, como um homem que para achar caminho não precisa o
auxilio da vista, transpoz a porta; mas então o seu olhar estava fito em
mim.
POLONIO
Segue-me, filha, vou procurar o rei. É o delirio do amor; a sua
violencia mata-o, e impõe á sua vontade actos de desespero, que nenhuma
outra paixão humana excitaria. Peza-me sinceramente. Dize-me,
ter-lhe-ías tu dirigido ultimamente alguma palavra cruel.
OPHELIA
Não, meu pae; mas obedecendo ás suas ordens, recusei as suas cartas e
evitei a sua presença.
POLONIO
Eis o que perturbou a sua rasão. Doe-me de o não ter conhecido melhor:
receiei que as suas intenções não fossem serias, e que só pretendesse
consummar a tua ruina. Arrependo-me do fundo de alma das minhas
desconfianças. Parece que o confiar cegamente na previdencia é o
apanagio da minha idade, como o contrario é o defeito da mocidade. Vem,
dirijâmo-nos ao rei, convem que elle nada ignore; porque o sigillo
d'este amor poderia acarretar mais desgraças do que a sua revelação
resentimentos. (Sáem ambos.)
SCENA II
Uma sala no castello de Elsenor
Entram o REI, a RAINHA, as suas comitivas, ROSENCRANTZ e GUILDENSTERN
O REI
Sejam bemvindos, caros Rosencrantz e Guildenstern. Independentemente do
gosto de os ver, a necessidade do seu prestimo me obrigou a chamal-os a
esta côrte sem demora. Ouviram seguramente fallar da transformação de
Hamlet; digo transformação, porque já não é o mesmo homem, nem moral nem
physicamente. Só a morte do pae póde ser a causa do transtorno da sua
rasão, não posso conceber outra. Educados com elle desde a infancia,
sympathisando entre si pela idade e pelo caracter, peço-lhes que
permaneçam algum tempo na côrte, procurem inspirar-lhe o gosto e prazer
da sua convivencia, aproveitem todas as occasiões para descobrir se a
sua afflicção não tem alguma causa desconhecida, cuja revelação nos
permittisse dar-lhe remedio.
A RAINHA
Bastante tem fallado nos senhores, e estou convencida que ninguem no
mundo lhes é mais affeiçoado. A liberalidade do rei compensará
largamente os seus serviços e os seus incommodos. Esperâmos dos senhores
esta prova de affeição.
ROSENCRANTZ
Vossas magestades são nossos soberanos, e os reis não pedem, mandam.
GUILDENSTERN
Estamos promptos a obedecer; disponham de nós, senhores. Depondo aos pés
dos reis os nossos serviços e a nossa dedicação, pedimos-lhes só que
ordenem.
O REI
Obrigado, senhores.
A RAINHA
Obrigada tambem eu; vão ter com meu filho: infelizmente mal o
reconhecerão. (Á sua comitiva) Alguns d'estes senhores conduzam estes
cavalheiros junto de Hamlet.
GUILDENSTERN
Praza a Deus, que a nossa presença lhe seja agradavel e os nossos
cuidados um lenitivo.
A RAINHA
Deus queira. (Rosencrantz e Guildenstern sáem seguidos de alguns
cortezãos.)
Entra POLONIO
POLONIO
Senhor, regressaram de Noruega os embaixadores, satisfeitos com o
resultado da sua missão.